quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

À conversa com...

Pedro Guilherme-Moreira

       A presença de um escritor em meio escolar é sempre marcante em qualquer plano de atividades, porque é no contacto direto com os autores que melhor se podem compreender as motivações para a escrita, numa primeira fase, e para a leitura, quando o aluno se torna leitor. E quando as palavras saem da boca de quem escreve, tanto melhor, porquanto aí está o testemunho presencial daquele que concebe a obra de arte literária capaz de abrir horizontes nos outros.
       Aquando a passagem de Pedro Guilherme-Moreira pela nossa Escola, algumas alunas de Literatura Portuguesa entrevistaram o autor, numa conversa muito enriquecedora. Todavia, a entrevista não ficou registada em formato áudio,por dificuldades de ordem técnica, pelo que solicitámos nova entrevista ao autor, mas por via eletrónica.  
       Agradecemos toda a disponibilidade do autor e publicamos aqui as respostas dadas. 





Com que idade sentiu o apelo da escrita com fins literários?
Está na badana do livro "A manhã do mundo". A professora Laura mandou-nos escrever uma fábula. Eu pensei: e se eu fizesse da professora uma formiga? Ela gostou da originalidade e mostrou aos outros meninos. Senti-me poderoso de uma forma bonita, porque os meninos não tinham tristeza por aquele colega se ter destacado fazendo da professora uma formiga. Percebi que a literatura era forma de poder com beleza natural. Claro que não é bem assim. Mas nunca mais parei. Escrevi só poesia até aos vinte e tal, experimentei a prosa, não gostei, segui na poesia até aos trinta e oito, e, então sim, adoeci de prosa, que aprendi a fazer lendo durante trinta anos.

Quais foram as suas principais referências, quando começou a escrever?
Os olhos das pessoas.

Tem temas preferenciais em que se inspira para escrever?
O carácter humano. A natureza humana.

Quais os principais desafios que enfrenta a partir do momento que toma a decisão de escrever um livro?
Tirar-me do livro. Deixar apenas o mundo e os outros no livro. Depois temos a questão prática: disciplina, muita para escrever. Menos de três horas é nada para uma sessão de trabalho num romance. Escrever todos os dias. E depois o desafio-mor: a edição e a revisão. "A manhã do mundo" foi revista 20 vezes. O "Livro sem ninguém" menos, porque cada revisão foi mais profunda: dez.

Qual o género literário em que se sente mais realizado? (Lírico ou narrativo)Se lerem o "Livro sem ninguém", verão que uso ambos. O lirismo é importante, tenha o nome que tiver. Na contracapa dizem que o livro é, a um tempo, cru, e a outro poético. Na literatura, não concebo crueza sem sal ou açúcar. Ou adoçante. Um adoçante, só um, por favor :).

Tem projetos de escrita já amadurecidos prestes a serem publicados ou em andamento?
O "Livro sem ninguém", já em Fevereiro. Espero que Ovar apareça num dos lançamentos que vão inaugurar a primavera, ou perto disso. Toda a minha poesia está inédita: só a publicarei com um editor dedicado que lhe queira mexer, mesmo que eu depois lhe diga: "Esteja quieto". E mais quatro ou cinco romances inéditos, porque eu não escrevo com regra de  mercado ou a pedido. Escrevo sempre. Projectos tenho para os próximos quarenta anos: imediatos e mediatos. Há uma ideia remota de uma continuação d"A manhã do mundo" que envolva um antes e um depois, lá para 2025. E o Holocausto - estou à espera de uma tradução do íidiche. E escultura - vou romancear a história do meu bisavô, escultor daquela estátua do leão e da águia na rotunda da Boavista, no Porto. Entre muitos outros.



Entrevista conduzida pelas alunas Catarina Afonso, 
Filipa Cardoso e Mariana Oliveira - 11ºE
Foto de Filipe Rilho 



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